Segunda-feira, 21 de Abril de 2008

Suicidas em Bagdade

.

O alerta surgiu este fim-de-semana: “um grupo da Al-Qaeda entrou na capital iraquiana para cometer ataques suicidas”, dizia em comunicado o exército americano. Na verdade, eu já o sabia desde o dia em que comecei a acompanhar os rangers em Sadr City. Ouvi-o durante uma reunião que as forças especiais americanas promoveram com líderes sunitas. Deixaram-me assistir e achei por bem não revelar o que lá se disse. A matéria era demasiado sensível. A área onde nos encontrávamos é frequentemente utilizada para a entrada de bombistas suicidas na capital iraquiana. Mais: os chefes tribais tinham detectado também a presença de dois iranianos com atitudes suspeitas. Os americanos interessaram-se de imediato.

 

Em cinco anos explodiram cerca de cinco mil e quinhentos carros-bomba no Iraque, na grande maioria em Bagdade. Um deles rebentou à porta do nosso hotel, há dois anos, quando editávamos mais uma reportagem para enviar para Lisboa. Vou relembrar o que se passou e que está publicado no meu livro, o Repórter de Guerra.

 

   O impacto faz abanar as janelas do nosso hotel.

   - Esta foi perto! – diz o Bruno.

   Vamos à janela do quarto e vemos uma nuvem de fumo a menos de cem metros. Abandonamos a peça que estávamos a montar e corremos para a rua. Alguma coisa explodiu num dos acessos ao hotel. Um dos seguranças agarra num pedaço de chapa retorcida, mas deixa-o cair de imediato. Está muito quente. Chegam carros dos bombeiros, ambulâncias e polícias. Começamos a filmar, mas somos rapidamente afastados. Dizem que pode haver um segundo carro bomba. É um comportamento habitual entre os terroristas: colocam um carro que explode, logo depois aproximam-se polícias e populares para socorrer os feridos e é então que fazem detonar os explosivos da segunda viatura. Compreendo a preocupação deles, só que as imagens não podem ficar para mais tarde. Temos que captar o que está acontecer. Furamos o cordão e aproximo-me do oficial que parece estar a comandar as operações. Mais uma vez a pergunta:     

   - De onde são?

   - Somos de Portugal?

   - Ah, Portugal! – virando-se para os subordinados, diz-lhes: Portugal fica depois da Espanha e junto a Marrocos. Portugal é um país muçulmano. Podem filmar!

   Não desfaço o engano e começamos os dois a filmar, eu e o Bruno, agora junto ao carro que ficou completamente desfeito. Teria entre cento e cinquenta a duzentos quilogramas de explosivos e foram accionados por um dispositivo de controlo remoto. Houve quem tivesse visto o terrorista a carregar no botão de um pequeno aparelho que tirou do bolso e a entrar numa de duas viaturas que o esperavam. Da forma como o carro estava estacionado e o momento em que a bomba foi detonada, mais não pretendia do que atingir quem passava. Apenas civis. Morreram duas pessoas e várias ficaram feridas. Nós fomos poupados porque havia um pequeno edifício que nos protegeu da onda de choque e dos estilhaços.

 

 

O Bassim prometeu-me que irá responder aos vossos comentários.

Espero pela chegada para publicar.

Obrigado a todos.

Luís castro

publicado por Luís Castro às 11:13
link do post
De Daniel Marques a 21 de Abril de 2008
"Ouvi-o durante uma reunião que as forças especiais americanas promoveram com líderes sunitas. Deixaram-me assistir e achei por bem não revelar o que lá se disse."

Você Luís, é um jornalista sensato, não é a "super star" do costume, por isso é que eles gostaram de si.

"- Ah, Portugal! – virando-se para os subordinados, diz-lhes: Portugal fica depois da Espanha e junto a Marrocos. Portugal é um país muçulmano. Podem filmar!"

Teremos de admitir que podemos não ser muçulmanos, mas temos muita ligação árabe tanto nas palavras quanto nos genes. Mas enfim, até me dá gozo que me confundam como um deles, gosto de me misturar, é sinal que me aceitam. O Bassim já é um dos nossos.
De Luís Castro a 22 de Abril de 2008
Naquela reunião, quando souberam que eramos portugueses e qual a nossa ligação à cultura árabe, exclamaram: "Ah! Então somos vossos tios!"
É mais ou menos isso.
Abraço, Daniel.
LC
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Perfil

Jornalista desde 1988
- 8 anos em Rádio:
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Rádio Renascença
RDP/Antena 1

- Colaborações em Rádio:
Voz da América
Voz da Alemanha
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Rádio Caracol (Colômbia)
Diversas - Brasil e na Argentina

- Colaborações Imprensa:
Expresso
Agência Lusa
Revistas diversas
Artigos de Opinião

RTP:
Editor de Política, Economia e Internacional na RTP-Porto (2001/2002)
Coordenador do "Bom-Dia Portugal" (2002/2004)
Coordenador do "Telejornal" (2004/2008)
Editor Executivo de Informação (2008/2010)

Enviado especial:
20 guerras/situações de conflito

Outras:
Formador em cursos relacionados com jornalismo de guerra e com forças especiais
Protagonista do documentário "Em nome de Allah", da televisão Iraniana
ONG "Missão Infinita" - Presidente

Obras publicadas:
"Repórter de Guerra" - autor
"Por que Adoptámos Maddie" - autor
"Curtas Letragens" - co-autor
"Os Dias de Bagdade" - colaboração
"Sonhos Que o Vento Levou" - colaboração
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