Já registei entradas de mais de cinquenta países. Mas há uma que me intriga: tu, que todos os dias vens ao blogue e que estás
Enquanto fico à espera da resposta, aqui vos deixo mais um pedaço da minha aventura no Iraque, fugindo dos americanos…
Beijos e abraços para todos.
Luís Castro
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Anoitece e acabamos parados com dois tiros disparados por cima dos nossos jipes. São novamente os americanos. Recuamos à procura de um abrigo seguro, uma vez que os “novos senhores do Iraque” não nos querem por perto. Avistamos alguns homens junto a um portão de uma fábrica que de pronto se oferecem para nos dar protecção. Não sei se podemos confiar neles ou não, mas também não temos alternativa. Ao verem os nossos jipes, param também alguns camionistas que transportam tomates e que procuram saber as nossas nacionalidades. Um deles avança para mim de dedo em riste:
- Ameriquia?
- No, no. Portugali!
- Portugali? Ah, brother, brother, senta, senta, come, come!
E assim fico, trocando cigarros e comida, conversando do Figo, dos nossos dois países, da cultura que partilhamos e, claro, da guerra.
- Então, porque é que vocês não lutam com os americanos? Não tarda nada chegam a Bagdade.
- Para quê? Lutar contra estas máquinas de guerra? Nem pensar. Morríamos logo. Quando eles estiverem instalados e relaxados, aí, sim, vamos dar-lhes caça!
Entendo. À maneira portuguesa, é do tipo: deixa-os pousar!
Já de manhã, o Vítor grava a conversa que uma mulher mantém pelo telefone do jornalista saudita para os Estados Unidos. Entre soluços, diz à cunhada que o país que anos antes a acolhera depois de fugir do Iraque agora lhe roubara o marido e que ficara viúva com os seus dez filhos. O homem veio visitar a família e morreu com uma bomba
lançada por um avião americano. O momento é intenso.
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Voltamos ao deserto e testemunhamos mais um daqueles momentos que revoltam. Soldados dos EUA arrastam dois iraquianos pelo pó, colocando os joelhos nas costas deles e revistando-lhes as roupas. Já vi isto em qualquer lado. Ah, grandes soldados! Conseguiram neutralizar um velho de oitenta anos e o filho que transportava duas cabras. Assim é que é: mais uma demonstração de quem manda no mundo! Quando finalmente se levantam, pedem água, mas os americanos não os compreendem e é o jornalista árabe quem traduz. O mais velho está furioso. “Passámos muito mal no tempo do Saddam, mas nunca me fizeram isto. Sou o chefe da minha aldeia, sou muito respeitado entre a minha gente e, por favor, nunca mais me obriguem a deitar no chão. É muito humilhante!”
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