Artigo do Daniel Oliveira, no "Expresso".
«Silvio Berlusconi explicou a quem o queria ouvir os segredos da sua popularidade entre as mulheres. Entre gracejos sobre o seu desempenho sexual e a sua fortuna, deixou claro que não era gay. Disse outras coisas, mas foi por isto que a comunicação social portuguesa puxou. A França está agitada por causa de uma biografia de Carla Bruni, a primeira dama sensação da Europa. Diz que ela é fria e pouco interessada pelas suas obras de caridade.
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Bem vistas as coisas, o Mundo não mudou assim tanto.
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O que mudou é a absoluta irrelevância da política. Poucos querem saber o que pensam e andam a fazer estes dois líderes, por sinal os mais perigosos da Europa, no seu desbragado populismo. A maioria dos cidadãos abomina a política e os políticos mas entusiasma-se com os seus segredos de alcova e os seus pecados privados. Vibra ou indigna-se com a sua boçalidade ou as suas hipócritas encenações.
Mesmo a popularidade de Obama, que varreu o Mundo há dois anos, deveu-se mais à sua simpatia e oratória, à sua raça e à sua juventude, do que ao corte político e ideológico que, apesar de tudo, a sua eleição significaria.
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O espectáculo da futilidade. A comunicação social, que deveria ser o palco do confronto político, transformou-se no palco da banalidade.
Berlusconi vive disto. Não é só um excelente actor. Realiza e distribui, através de um quase monopólio dos canais de televisão, o filme em que ele é sempre personagem principal. Sem o mesmo poder, Sarkozy também se move bem no "showbiz" da política pimba. E, enquanto os cidadãos se distraem com as suas vidas, os seus escândalos, os seus divórcios, os seus casamentos, eles expulsam imigrantes, perseguem minorias e alimentam o ambiente de intolerância que a crise económica propicia.
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Julgávamos que com uma comunicação social livre teríamos os cidadãos mais informados e conscientes que a história da democracia alguma vez conhecera. Pode alguém confirmar esta ingénua esperança? A verdade é que milhões de cidadãos com um telecomando na mão não fazem uma democracia. Fazem uma mediocracia. Não é a mesma coisa. Arrisco-me a dizer que são coisas opostas. »