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Bagdade está a viver um fim-de-semana de calma aparente. Noto que as famílias iraquianas vieram para a rua fazer compras e sigo rumo à zona comercial da cidade. Gastamos dez minutos a fazer imagens e o guia começa a ficar apreensivo. “Estás a abusar da sorte!”, diz-me Bassim. E tem razão. Até os comerciantes começam a ficar inquietos com a nossa presença. Os polícias pedem que abandonemos o local, pois podemo-nos tornar num chamariz para os bombistas suicidas. Obedeço de imediato.
Colunas de soldados americanos passam ao nosso lado e perante a indiferença dos iraquianos. Pego no microfone e pergunto-lhes se ainda sentem necessidade das forças ocupantes. “Pagámos sangue por esta segurança. Não queremos mais tanques dos Estados Unidos nas nossas ruas. Pedimos aos americanos que partam.”, atira de imediato um habitante de Bagdade, opinião confirmada mais ao lado por um oficial do exército iraquiano: “Temos uma civilização de milhares de anos. Sabemos tomar conta de nós.” Na realidade, até há pouco tempo as novas forças de segurança não tinham capacidade para combater a resistência e os insurgentes da Al-Qaeda. Agora já não é assim, os “comandos” do Ministério do Interior vieram dar mais uma demonstração de força, juntando-se ao Exército e à Polícia. É altura de mudar novamente de sítio.
Dou de caras com um parque infantil numa das margens do rio Tigre. Fantástico. É isto mesmo. Uma excelente oportunidade de mostrar lá para Portugal como a vida em Bagdade começa a mudar, embora muito lentamente. Pais com crianças, fazendo piqueniques e guardados por homens com kalashnikovs. Convidam-me para almoçar. Digo que não mas o guia alerta-me para o facto de, uma vez feito o convite, já não poder recusar. E ainda bem, pois a comida é tradicional e muito saborosa: arroz, massa, frango e cebola, tudo num paladar adocicado. Como eu gosto, de resto. Ao lado, as crianças brincam, ignorando na sua inocência a loucura que vai para lá destes seguranças armados. À minha pergunta: que futuro para este Iraque, Rana, de dezasseis anos, diz-me que o Iraque será bom, “porque as flores continuam a abrir todos os dias.” Ninguém conseguiria resumir melhor a esperança deste povo.